Maupassant | Contos Escolhidos de Guy de Maupassant | E-Book | sack.de
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E-Book, Portuguese, 408 Seiten

Maupassant Contos Escolhidos de Guy de Maupassant


1. Auflage 2012
ISBN: 978-972-20-4741-8
Verlag: D. QUIXOTE
Format: EPUB
Kopierschutz: 0 - No protection

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ISBN: 978-972-20-4741-8
Verlag: D. QUIXOTE
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Na presente edição reúne-se uma selecção de contos daquele que é considerado o grande mestre do conto francês, e um dos seus maiores expoentes na história da literatura: Guy de Maupassant. A escolha dos contos deve-se a uma estreita colaboração entre Miguel Viqueira e Pedro Tamen, que os traduz, com a mão do grande poeta que é, de forma soberba. Da vasta obra literária que o autor nos deixou, foram escolhidos quarenta e dois contos, divididos em três partes: 'Contos mundanos, amorosos, eróticos e galantes', 'Contos inquietantes, de horror e de mistério' e 'Contos exemplares'. Esta recolha procura dar a conhecer aos leitores portugueses a maravilha que é a prosa deste grande escritor do século XIX.

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A Casa Tellier

1.

Iam lá todas as noites, por volta das onze, simplesmente como quem vai ao café.

Eram seis ou oito os que ali se encontravam, sempre os mesmos, não uns pândegos quaisquer, mas homens respeitáveis, comerciantes e gente nova da cidade; e tomavam o seu licor fazendo algumas brincadeiras travessas às raparigas, ou então conversavam gravemente com a Madame, que toda a gente respeitava.

E depois saíam para se irem deitar antes da meia-noite. Às vezes os jovens ficavam.

Era uma casa de família, pequenina, pintada de amarelo, na esquina de uma rua por trás da igreja de Santo Estêvão; e das janelas avistava-se a doca cheia de navios a descarregar, o grande brejo salgado a que chamavam «A Retenção» e, lá atrás, a costa da Virgem com a sua velha capela enegrecida.

A Madame, oriunda de uma boa família de camponeses do departamento do Eure, aceitara aquela profissão exactamente como poderia ter sido modista ou fanqueira. O preconceito desonroso ligado à prostituição, tão violento e vivaz nas cidades, não existe nas terras de província normandas. O camponês diz: «É um bom ofício»; e destina ao filho a gestão de um harém de raparigas do mesmo modo que lhe daria a gerir um internato de meninas.

De resto, aquela casa viera por herança de um velho tio seu proprietário. O Senhor e a Madame, em tempos estalajadeiros nos arredores de Yvetot, haviam imediatamente liquidado o seu negócio, por considerarem que o de Fécamp lhes seria mais vantajoso; e tinham chegado um belo dia para assumir a direcção da empresa que estava periclitando na ausência dos patrões.

Eram boas pessoas, que desde logo conquistaram a estima do pessoal e dos vizinhos.

O Senhor morreu de uma congestão passados dois anos. Como a sua nova profissão lhe proporcionava uma vida de indolência e imobilidade, engordara muito e a saúde liquidara-o.

A Madame, depois de enviuvar, era desejada em vão por todos os frequentadores habituais do estabelecimento; mas tinha a fama de ser absolutamente honesta, e nem sequer as suas pensionistas haviam descoberto fosse o que fosse.

Era alta, cheia de carnes, elegante. A pele, empalidecida na obscuridade daquela casa sempre fechada, brilhava como que untada por um verniz gorduroso. Rodeava-lhe a testa um esguio enfeite de cabelos travessos, o que lhe dava um aspecto juvenil que destoava da maturidade das suas formas. Invariavelmente alegre e de expressão franca, era dada a gracejos, com uma tonalidade comedida que as suas novas ocupações ainda não lhe tinham feito perder. As palavras feias chocavam-na sempre um pouco; e, quando um rapaz mal educado chamava pelo nome próprio o estabelecimento que dirigia, zangava-se, revoltada. Tinha, enfim, uma alma delicada e, embora tratasse as suas mulheres como amigas, não se cansava de repetir que «não era da mesma laia».

Às vezes, durante a semana, saía num carro de aluguer com uma parte do seu grupo; e iam folgar na relva à beira de um regato que corre nas terras de Valmont. Havia então pensionistas que desapareciam fugidas, correrias loucas, brincadeiras infantis, toda uma alegria de reclusas inebriadas pelo ar livre. Comiam enchidos deitadas na relva bebendo cidra, e voltavam ao entardecer com um delicioso cansaço, com uma doce comoção; e no carro beijavam a Madame que era tão boa mãe, cheia de mansidão e complacência.

A casa tinha duas entradas. Na esquina da rua havia uma espécie de café de ruim aparência, que abria à noite para a gente do povo e para os marinheiros. Duas das pessoas encarregadas do comércio específico do local eram particularmente destinadas às necessidades daquela parte da clientela. Com a ajuda do criado, chamado Frédéric, um loirinho imberbe e forte como um boi, serviam os quartilhos de vinho e as litradas nas mesas desengonçadas de mármore, e, com os braços à roda do pescoço dos bebedores, sentadas de viés nas pernas deles, encorajavam-nos a consumir.

As três outras damas (elas eram ao todo cinco) formavam uma espécie de aristocracia, e permaneciam reservadas ao grupo do primeiro andar, a não ser quando precisavam delas lá em baixo e o andar de cima estava vazio.

O salão de Júpiter, onde se reuniam os burgueses do lugar, era forrado a papel azul e enfeitado com um grande desenho que representava Leda estendida debaixo de um cisne. Chegava-se até lá através de uma escada de caracol que terminava numa porta estreita, de aparência humilde, que dava para a rua, e por cima da qual brilhava toda a noite, atrás de uma grade, uma pequena lanterna daquelas que se acendem ainda em certas cidades aos pés das Nossas Senhoras encastradas nas paredes.

O prédio, húmido e velho, cheirava ligeiramente a mofo. De vez em quando perpassava pelos corredores um hálito de água-de-colónia, ou então uma porta entreaberta lá em baixo fazia ressoar por toda a casa, como a explosão de uma trovoada, os gritos popularunchos dos homens das mesas do rés-do-chão, e provocava nas caras dos senhores do primeiro andar um esgar de inquietação e repugnância.

A Madame, íntima dos seus amigos clientes, não saía da sala, e interessava-se pelos boatos que corriam na cidade e que através deles lhe chegavam. A sua conversa séria contrastava com as frases incoerentes das três mulheres; ela era como que uma pausa na jovialidade brejeira dos senhores barrigudos que todas as noites se entregavam àquele honesto e medíocre deboche de beberem um cálice de licor na companhia de mulheres públicas.

As três damas do primeiro andar chamavam-se Fernanda, Rafaela e Rosa Pileca.

Como o pessoal era pouco, tinha-se procurado que cada uma delas fosse uma espécie de amostra, de um resumo do tipo feminino, para que todos os consumidores pudessem encontrar ali, ao menos aproximadamente, a realização do seu ideal.

A Fernanda representava a loiraça, muito alta, quase obesa, mole, rapariga do campo cujas sardas se recusavam a desaparecer, e cujo cabelo amarelo-desbotado, encurtado, claro e sem cor, que parecia cânhamo penteado, mal lhe cobria o crânio.

A Rafaela, uma marselhesa, prostituta dos portos de mar, representava o papel indispensável da bela judia, magra, com as maçãs do rosto cobertas de vermelhão. Os cabelos pretos, postos a brilhar com medula de boi, encaracolavam-se-lhe nas têmporas. Os olhos teriam sido bonitos se o direito não tivesse a marca de uma catarata. O nariz arqueado descaía sobre uma queixada proeminente, onde dois dentes novos, de cima, contrastavam com os de baixo, que, com o tempo, tinham tomado uma coloração escura como a das madeiras antigas.

A Rosa Pileca, uma bolinha de carne toda ela barriga com umas pernas minúsculas, cantava de manhã até à noite, numa voz rouca, umas cantigas ora licenciosas ora sentimentais, contava histórias intermináveis e insignificantes, só parava de falar para comer e de comer para falar, e andava sempre de um lado para o outro, ágil como um esquilo apesar da gordura e da exiguidade das patas; e o seu riso, uma cascata de gritos agudos, estalava constantemente, por aqui e por ali, num quarto, no sótão, no café, por toda a parte, a propósito de tudo e de nada.

As duas mulheres do rés-do-chão, a Luísa, apelidada de Cocote, e a Flora, chamada Baloiço por coxear um bocado, uma sempre vestida de Liberdade com uma faixa tricolor à cintura, e a outra de espanhola de fantasia com cequins de cobre que lhe dançavam no cabelo cor de cenoura a cada um dos seus passos desiguais, dir-se-iam serventes de cozinha mascaradas para um carnaval. Semelhantes a todas as mulheres do povo, nem mais feias nem mais bonitas, verdadeiras criadas de estalagem, eram designadas no porto pela alcunha de «as duas Chancas».

Reinava entre estas cinco mulheres uma paz ciumenta, mas raramente perturbada, graças à sabedoria conciliadora da Madame e ao seu inesgotável bom humor.

O estabelecimento, único naquela pequena cidade, era muito frequentado. A Madame soubera infundir-lhe uma apropriada elegância: mostrava-se tão amável, tão obsequiosa para com toda a gente, e o seu bom coração era tão bem conhecido que era rodeada de uma espécie de consideração. Os frequentadores habituais eram capazes de fazer tudo por ela e sentiam-se triunfantes quando ela lhes demonstrava uma amizade mais evidente; e quando durante o dia se encontravam nos seus locais de trabalho diziam uns para os outros: «Até logo à noite, onde a gente sabe», como quem diz: «No café, não é verdade? Depois do jantar.»

Enfim, a casa Tellier era um refúgio, e raramente alguém faltava ao encontro quotidiano.

Ora aconteceu que uma noite, em fins de Maio, o primeiro a chegar, o senhor Poulin, negociante de madeiras e antigo presidente da Câmara, deparou com a porta fechada. O lanternim, atrás da sua grade, não brilhava e não saía qualquer ruído da casa,...



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